Ajuda que vai além da epiderme

Serviço de atendimento psicológico para crianças e adolescentes portadores de doenças crônicas de pele auxilia famílias a enfrentarem os estigmas sociais  
Por Rogério Nozi

Lidar com doenças crônicas é uma tarefa difícil tanto para os portadores quanto para seus familiares. A situação torna-se ainda mais delicada quando essa doença se manifesta na pele. Numa sociedade em que o aspecto exterior é fator de exclusão, aqueles que apresentam qualquer característica que fuja dos padrões estéticos estabelecidos corre o risco de ser discriminado.

Para atender pessoas nessas condições, há três anos, foi criado o serviço de auxílio psicológico para crianças e adolescentes portadores de doenças crônicas de pele e seus familiares, um projeto vinculado à pesquisa e extensão do Depar“tudo a gente pode aprender, inclusive aprender a enfrentar os problemas de uma forma diferente”tamento de Psicologia da Uel.

 Sob a coordenação da Professora Márcia Gon, a iniciativa visa atender jovens portadores de doenças como vitiligo, dermatite atópica e psoríase, que acometem uma parcela considerável da população mundial. De acordo com a psicóloga, entre os principais problemas identificados no comportamento dos pais e das crianças participantes do projeto estão a ansiedade que eles e os filhos apresentam frente a essas doenças, cujas curas ainda não foram descobertas e que provavelmente os acompanharão durante toda a vida; o estresse, que é uma resposta biológica dada pelo corpo aos estímulos e pressões externas; e o preconceito social. Fatores esses que agravam ainda mais o quadro das crianças que já sofrem diariamente com o incômodo das lesões causadas pelas doenças.

“Por serem doenças que se manifestam externamente, as crianças são apontadas na escola e muitas vezes têm dificuldade para explicar o que está acontecendo com elas. Por isso é importante a orientação do psicólogo para que os pequenos desenvolvam um entendimento melhor de sua situação e maneiras de enfrentar o preconceito”, explica a professora.

O atendimento aos pais e aos filhos é feito através de psicoterapias em grupo. Nessas ocasiões, os pais têm a oportunidade de trocar experiências, identificar-se, e aprender com outros pais que vivenciam situações parecidas com a deles. Para as crianças, são desenvolvidas atividades lúdicas. O resultado do esforço, segundo Márcia, é uma maior facilidade dos pequenos em expressar seus sentimentos e, para os pais, um alento. Para a psicóloga Camila Menezes, os problemas enfrentados pelos pais dos portadores de doenças de pele são os mesmos de quaisquer outros pais

 Integram o projeto estudantes do terceiro e quarto anos do curso de psicologia.  Camila Menezes já colaborou em anos anteriores; hoje, formada e estudante de pós-graduação, pretende continuar com os atendimentos. “Foi uma ótima experiência que me fez aprender bastante, porque eu também carregava alguns preconceitos com relação a doenças de pele. No grupo, percebi que as dificuldades que os pais apresentavam eram as mesmas daqueles que não tinham necessariamente filhos com esses problemas, como desobediência, irritação e dificuldade de comunicação”, exemplifica.

A orientação psicológica é de extrema importância para a família. Além disso, contribui com o tratamento médico, uma vez que melhora a forma como pais e filhos lidam com a doença. E isso é refletido na redução do número de vezes em que as famílias procuram atendimento nos hospitais.

 

Serviço:

Os interessados em participar do projeto devem ligar para o telefone (43)3371-4237. O início dos atendimentos está previsto para o mês de agosto.

 

Published in: on 28/05/2008 at 6:54 PM  Deixe um comentário  

UM JEITINHO MAIS QUE BRASILEIRO

Por Carolina Rocha Barbosa 
 

         Quando se fala em corrupção imagina-se, imediatamente, políticos corruptos que circulam por aqui ou pelos lados do planalto central. Mas não é apenas no congresso ou no senado. A crise ética está em todas as esferas da sociedade brasileira.

         Pode-se dizer que isso não é apenas fruto das falcatruas vigentes em Brasília, mas resultado de um processo histórico que se deu ao longo de 500 anos.

         Reconhecido nacionalmente como a forma especial que os brasileiros têm para resolver seus problemas, o jeitinho foi transformado em rito e sua prática se amplia para ser utilizada em todas as situações conflitantes da realidade social. E isto ocorre desde o princípio. Na terra de Santa Cruz, portugueses já colocavam em prática a troca de favores para driblar as dificuldades. Com o passar dos anos, os padrões culturais da vida colonial brasileira se reproduziram da mesma forma.

         A sociedade brasileira é coletivista por natureza e não foi fundada no indivíduo, mas nas relações pessoais. Por um lado, bom: o brasileiro não é exclusivamente egoísta. Por outro, vivencia-se somente aquilo que as suas relações pessoais lhe permitirem conseguir. 

         A desigualdade do país dá a idéia – e não só a idéia, mas a real formação – de injustiça social. E essa situação cria possibilidades para se formar mecanismos úteis a fim de driblar essa injustiça. A própria deficiência do sistema jurídico acaba transmitindo o desejo de caminhar na contramão das normas, quando convém. Tem sempre um jeitinho para fugir da burocracia, das filas intermináveis, da dificuldade para passar em um concurso público.

         O jeitinho brasileiro é a transgressão suave já institucionalizada e aceita como característica fundamental e indispensável para o simpático e alegre brasileiro legitimar o seu poder diante dos outros. O seu problema é sempre mais urgente que o do vizinho. E isso, claro que somente isso, justifica que você fure a fila do supermercado.

         O componente das relações pessoais que envolvem “capital” são interessantes. Acumula-se em termos de contato e influência. O antropólogo Roberto Da Matta diria: Seria como se as relações pessoais entre nós desempenhassem o papel do Judiciário nos países individualistas e igualitários. Como cabe ao Poder Judiciário dirimir conflitos a partir dos casos concretos, teríamos, no nosso caso específico, uma resolução “informal”, sem burocracia e rápida: através da “carteirada”, do jeitinho, da ameaça velada e do “você sabe com quem está falando?”.

         Esse mecanismo de navegação social pode ser comparado ao uso das estratégias de negociação nos contratos sociais, em muitas vezes equiparado a um ajuste social para superar as dificuldades financeiras das camadas desprivilegiadas e a aceitação de certas transgressões como forma de protesto.

         Em função da prática generalizada, que faz parte do nosso dia-a-dia, a rigidez da honestidade acabou sendo domesticada e agora assume novas proporções. E esse tipo de atitude, que vem se expandindo, contribui para aumentar a desigualdade social e até mesmo para legitimá-la.

         O Brasil enfrenta uma crise ética de grandes proporções e desta forma o desafio de preservar a integridade moral e o vencimento de obstáculos tornou-se necessidade constante na vida em coletividade.

Published in: on 28/05/2008 at 4:29 PM  Deixe um comentário