A marcha da maconha e a supressão da livre expressão

Por Nikolai Streisky

 

A Cannabis sativa é uma planta herbácea da família das Canabiáceas. Os primeiros registros históricos de seu uso datam de 8.000 A.C. (Antes de Cristo), na China, para a produção de papel, e, posteriormente, usada em artigos têxteis e na medicina. Sua grande importância histórica se deve ao fato de que a maconha tem a fibra natural mais resistente e forte do que todas as outras plantas, podendo ser cultivada em praticamente qualquer tipo de solo. Pode ser usada na confecção de tecidos e suas sementes são ricas em óleo utilizado na produção de biodiesel, além, é claro, do efeito narcótico que a fumaça da planta fêmea produz.

Para se ter apenas uma base de comparação, a Cannabis sativa se desenvolve duas vezes mais rápido e precisa de menos nutrientes do solo do que o eucalipto, planta usada atualmente para a confecção de papel. Atualmente, de acordo com a maior parte da legislação mundial, a existência da planta é proibida. Seu plantio é criminoso e caso ela seja encontrada livre na natureza, deve ser destruída. Irônico, mas cabe lembrar que a primeira bíblia impressa está em papel de cânhamo. 

Não trataremos aqui os motivos que levaram uma planta tão versátil a ser proibida, mas sim da atual discussão que segue em torno dela. A Marcha Mundial da Maconha é um movimento pela legalização da Cannabis e, como o nome sugere, acontece em todo o planeta. O movimento surgiu em Nova York, em 1999. Desde 2002, a marcha acontece no Brasil.

A última marcha estava prevista para acontecer no dia 4 de maio em 12 capitais brasileiras, mas foi realizada apenas em Vitória, Recife, Florianópolis e em Porto Alegre. No restante das capitais, São Paulo, Salvador, Cuiabá, Fortaleza, João Pessoa, Curitiba, Brasília e Belo Horizonte a Justiça proibiu a manifestação, por entender que se trata de apologia à droga e, consequentemente, isso constitui um crime. Esse posicionamento levou à detenção das pessoas que insistiram em se manifestar, como em Curitiba, onde a Polícia Militar prendeu seis jovens sob a alegação de apologia às drogas e porte de maconha. A Polícia Militar chegou a abordar 90 pessoas, mas elas foram liberadas em seguida.

O que aconteceu na prática foi o aparato do Estado, movido por uma moral estanque e retrógrada, impedindo a livre manifestação de idéias. O que é mais perigoso? Pessoas se reunindo a favor de uma posição heterodoxa ou o Estado impedindo que teses contrárias não sejam expressas?

Published in: on 16/05/2008 at 11:33 PM  Deixe um comentário  

O medo e a escalada da dengue no Rio

Como moradores da zona Norte e Sul enxergam o problema

 

Por Nikolai Streisky

 

            A dengue é um dos principais problemas de saúde pública mundial; ainda mais agora em tempos de Aquecimento Global, com o aumento das temperaturas médias do globo, ampliando o habitat do mosquito Aedes aegypti, o mosquito transmissor da doença. Apenas no Brasil, entre janeiro a março de 2008, ocorreram 120.413 casos de dengue clássica, 647 casos de Febre Hemorrágica da Dengue (FHD) e 48 óbitos. O que mostra um grande retrocesso do país no combate da doença, já que de 1923 a 1980 acreditava-se que a mesma havia sido praticamente eliminada. Mas a partir de 1980, novos focos apareceram, provenientes de países vizinhos, que não obtiveram tanto êxito quanto o Brasil na erradicação dos focos do mosquito.

            Os primeiros focos surgiram em 1981/1982, em Boa Vista (RR), e em 1986/1987 no Rio de Janeiro. Depois, a doença novamente se espalhou pelo restante do país. No período de 1986 a outubro de 1999, foram registrados 1.104.996 casos de dengue em 19 dos 27 Estados brasileiros. Para uma doença que se acreditava praticamente extinta há apenas uma década antes, os números mostram a displicência dos governantes e cidadãos.

            Não basta apenas o Governo tomar as providências necessárias para o controle do mosquito, que se reproduz em água limpa parada. Também é necessária a plena participação dos cidadãos, como afirma Clarissa de Sá Mendez, 32, moradora do bairro do Botafogo, na zona Sul do Rio de Janeiro: “quando o número de casos de dengue diminui as pessoas tendem a relaxar. Enquanto não levarmos a doença a sério, ela continuará voltando sempre”.

Joelma de Souza, 25, moradora do bairro Bonsucesso, zona Norte, concorda com a tese da displicência dos cidadãos. “Aqui o povo só se mexe com essas campanhas. Ficamos com medo dos números, mas parece que só com o medo nos esforçamos para acabar com os focos de reprodução”.

Outro problema apontado por ambas são as moradias irregulares no Rio. “Se não existe nem esgoto e luz nas favelas, como pode haver controle do mosquito da dengue?”, afirma Joelma. “Temos menos casos de focos da dengue aqui na zona Sul, mas isso não quer dizer que estamos isentos de responsabilidade. A luta é de todos nós”, complementa Clarissa.

Infelizmente, fica claro que a estratégia do medo, apesar de prejudicial, é o que faz algumas pessoas levarem a sério uma doença tão perigosa como a dengue. Quando não precisarmos mais apelar para técnicas tão brutais de convencimento, estaremos mais próximos de erradicar de vez o mosquito da dengue.

Published in: on 16/05/2008 at 11:32 PM  Deixe um comentário